Stan Lee & Jack Kirby, Roy Thomas & Neal Adams e Chris Claremont & John Byrne e o legado das primeiras décadas dos Filhos do Átomo nas HQs.
Os X-Men surgiram originalmente em 1963, fazendo parte de uma série de novas idéias e títulos propostos pelo editor Stan Lee, da editora Marvel Comics.
Lee, no caso, tal como já havia feito com outras de suas criações, dava continuidade à exploração de um novo modelo de personagens de quadrinhos do gênero super-heróis. Essa então recente proposição super-heroística mesclava ironia e características anti-heróicas, à época pouco comuns aos personagens das revistas de histórias em quadrinhos, trazendo heróis que conviviam com problemas ou dificuldades que também poderiam afetar o leitor comum, como a incompreensão dos semelhantes, dificuldades econômicas, conflitos com autoridades policiais e crises de consciência. A fórmula já havia apresentado ótimos resultados com o monstro verde Hulk(1962) e com o desajustado adolescente Peter Parker, oHomem-Aranha (que também havia começado ficcionalmente a grudar suas teias nos prédios da cidade de Nova York em 1962), entre outros.
Infelizmente, o grupo de adolescentes com poderes mutantes devido à exposição da geração anterior à energia atômica – originalmente composto por Cíclope, Garota Marvel, Anjo, Fera e Homem de Gelo e orientado por um tutor paternal e compreensivo, o Professor Charles Xavier, também ele um mutante -, não conseguiu nem de longe se aproximar do sucesso dos personagens anteriores. Apesar do trabalho artístico sempre admirável do mestre Jack Kirby e da proposta temática interessante, eles não conseguiram passar, em seus primeiros anos de participação na falange Marvel, de heróis de terceira ou, no máximo, segunda categoria. Colocação injusta, sim. Mas, à época, real e provavelmente justificada. Afinal, tratava-se apenas de mais um grupo de heróis surgidos na esteira da ameaça nuclear, que combatiam malfeitores de mesma origem (a chamada Irmandade de Mutantes, chefiada pelo vilão Magneto). Nas primeiras aventuras da equipe, nem sequer se cogitava a respeito da dicotomia Martin Luther King e Malcolm X, que posteriormente veio a centralizar, respectivamente, as análises das figuras dos líderes dos X-Men e da Irmandade.
Pouca influência tiveram nesse panorama desfavorável as primeiras mudanças de equipe de produção que ocorreram no título dos heróis mutantes, ainda que dela fizessem parte um bom roteirista (Roy Thomas) e um ótimo desenhista (Neal Adams). A partir do número 67, as histórias inéditas deixaram de ser produzidas, e reprises começaram a preencher as páginas da revista, uma situação que durou até o número 93. A partir do número 94 um novo roteirista, Chris Claremont, assumiu as histórias dos Filhos do Átomo.
Os Novos X-Men
A chegada de Claremont foi antecedida por uma edição especial com os jovens heróis, Giant Size X-Men 1, com capa datada de maio de 1975. Na edição, após a equipe original desaparecer em uma ilha do Pacífico, seu mentor toma a decisão de convocar uma equipe de resgate, denominada de Novos X-Men, para procurá-los.
Essa equipe era bem mais variada e multi (ou pluri) nacional do que a anterior. Dela faziam parte um teleportador alemão de cor azul (Noturno), uma africana com domínio do clima (Tempestade), um camponês russo que transformava seu corpo em aço (Colossus), um nativo norte-americano com força e resistência extraordinárias (Pássaro Trovejante), um canadense que fazia lâminas de aço brotar das juntas de sua mão (Wolverine), um irlandês com capacidade de dar gritos supersônicos (Banshee) e um japonês que disparava labaredas e produzia calor (Solaris). Os responsáveis por essa história emblemática, verdadeiro marco da saga dos hoje quase cinquentões X-Men foram o roteirista Len Wein e o desenhistaDave Cockrum.
Com o número especial, montou-se o palco no qual, nos anos seguintes, brilharia a estrela de Chris Claremont, que se tornou o escritor oficial da série a partir de então e pode ser diretamente responsabilizado por seu sucesso posterior. A revista dos novos X-Men rapidamente se tornou a campeã de vendas e de aclamação da crítica da Casa das Ideias. E essa popularidade apenas aumentou quando outra figura emblemática da indústria de revistas em quadrinhos, o britânicoJohn Byrne, assumiu a parte gráfica das histórias. Escritor e desenhista se completaram de uma forma verdadeiramente harmoniosa.
Os dois artistas iriam revigorar o título e levá-lo a alturas que poucos haviam atingido, permanecendo à frente dele – juntamente com o arte-finalista Terry Austin – até finais dos anos 1980. Ampliaram-se os conflitos entre os diversos personagens, que passaram a ter grande papel nos enredos e aventuras, como o que envolveu o líder da equipe Cíclope e o sempre insatisfeito Wolverine. O estilo de liderança do primeiro colide diretamente com o espírito de discordância do segundo. Aos poucos, os artistas introduzem nas histórias a noção de que o grupo é mais do que a soma de suas partes. Segundo Richard Reynolds em seu livro Super Heroes: a modern mythology (London: Batsford, c1992), “Byrne e Claremont também introduziram noções Cabalísticas sobre a mística Árvore da Vida no roteiro, para reavivar o tema Gestalt do grupo mutante – que pode em si mesmo ser ligado ao romance de Theodore Sturgeon, More than Human”. Esse livro, originalmente publicado em 1953, trata de um grupo de seis pessoas com poderes extraordinários que é capaz de mesclar suas habilidades, conseguindo agir como um único organismo.
Da colaboração dos dois autores surgiram durante os anos 1970 e 1980, algumas das sagas mais aclamadas vividas pelo grupo de heróis. Na de Proteus, enfrentam um mutante assassino. Na da Fênix Negra, assistem à Jean Grey, a Garota Marvel, transformar-se em uma poderosa entidade depois se sacrificar para salvar o mundo. Em "Dias de um futuro Esquecido" defrontam-se pela primeira vez com o conceito de realidades alternativas. E na história "Deus Ama, o Homem Mata", enfrentam pela primeira vez a realidade do preconceito dos humanos em relação aos mutantes.
A dupla Claremont/Byrne eventualmente se desfez e cada um seguindo o seu caminho. O término da parceria, no entanto, felizmente não conseguiu ter reflexo muito negativo nas histórias dos X-Men, que permaneceram ainda sob a batuta de Claremont durante algum tempo, enquanto Byrne se transferia para outro título. Ambos haviam plantado em solo fértil as sementes da popularidade do grupo de mutantes, que permaneceram inalteradas nas décadas seguintes, passando a fazer parte de suas características distintivas. Inclusive, várias das premissas que eles desenvolveram em suas narrativas foram incorporadas à própria mitologia dos heróis e posteriormente aproveitadas nas diversas produções cinematográficas sobre eles.
De fato, o primeiro filme dos X-Men trouxe novo vigor às películas centrados nos super-heróis, demonstrando cabalmente que era possível reproduzir nas grandes telas, graças ao avanço tecnológico, as características desses personagens, sem necessariamente levá-los ao ridículo. Nesse sentido, foram um marco tanto para o cinema como para o gênero de quadrinhos ao qual esses personagens pertencem. Em produções bem elaboradas, sob direções seguras, todas as realizações centradas nos Filhos do Átomo possibilitaram a ampliação de sua popularidade, a ampliação de seu público leitor e a manutenção de seu título nas bancas, num círculo virtuoso que, felizmente, ainda não parece próximo de seu encerramento. Tudo indica, inclusive, que a próxima produção desses personagens a atingir as grandes telas continuará nessa mesma linha.
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